O ponto de partida, nesta pesquisa é o entendimento de rural e urbano, campo e cidade, como categorias de classificação do mundo social, espaços geossimbólicos, seja como conceito seja como representação social e de que o debate sobre rural e relações rural-urbanas não pode ignorar inflexões – nas representações de rural, como periférico – voltadas à perspectiva de cidadania cultural. Isto aponta para a necessidade de pensar políticas de cultura, no campo, com a mesma atenção dada a áreas urbanizadas, uma vez que, em localidades rurais, estas políticas ainda não apresentam protagonismo. O Programa Arca das Letras, da Secretaria Especial de Agriculta Familiar e do Desenvolvimento Agrário (SEAD), instituído em 2003 por demanda de movimentos sociais, apresenta-se como uma política cultural de incentivo à leitura voltada para povos rurais, visando a disponibilizar o acesso a livros e a capacitar agentes de leitura. Nesta pesquisa, focaliza-se a experiência do Programa em localidades rurais do Município de Teresina, Estado do Piauí, capital brasileira com a maior área rural do país, buscando compreender a produção de sentidos de atores sociais envolvidos, em particular agentes de leitura e agentes da gestão pública relacionado(as) ao programa. Nesta pesquisa, a abordagem é predominantemente qualitativa e interpretativa, com aporte da sociologia interpretativa, em diálogos com a antropologia interpretativa e a psicologia social. Teve como abordagem metodológica, pesquisas teórica, documental e de campo. A pesquisa teórica focalizou categorias e conceitos como políticas culturais; práticas culturais; políticas do livro e da leitura; livro, leitura e biblioteca; leitura e relação da produção de livros com o mercado; ruralidades, povos rurais. A pesquisa documental voltou-se para documentos do Programa Arca das Letras e afins. A pesquisa de campo, em um trabalho de observação direta, cobriu as 29 localidades – e uma Associação – onde foi instalado o Programa Arca das Letras, nos rurais teresinenses.Foram ouvidos agentes de leitura dos rurais teresinense e agentes da gestão pública nos planos nacional e estadual. Os resultados da pesquisa apontam para uma produção de sentidos os quais puderam ser categorizados nas dimensões de positividade e de negatividade. Constatou-se a desativação do programa nos rurais teresinense, e o consequente sentimento de abandono expressado nas falas de agentes de leitura; bibliotecas, ainda ativas, funcionando, predominantemente nas sedes de algumas escolas e creches; quase nenhuma informação da gestão pública sobre a situação do programa em Teresina. Em um plano mais geral, extrapolando os limites do município de Teresina, constata-se, com base na pesquisa que, apesar de o Arca ter-se expandido no Brasil, o Programa não teve força política necessária para obter maiores investimentos como política cultural, o que aponta para o lugar subvalorizado das políticas de cultura, sobretudo, as voltadas para povos rurais, no país, as quais não apresentam paridade com as voltadas a áreas urbanas. Assim, permanecem os desafios de uma maior atenção à relação entre ruralidades, povos rurais e cultura, como eixo em políticas de desenvolvimento.