Nesta pesquisa, volto o olhar sobre o processo criativo do grupo de artesãs ceramistas do Poti, composto por cerca de trinta mulheres integrantes da Cooperativa de Artesanato do Poti Velho (Cooperart-Poty). No processo, desde os inicios da constituição deste grupo, e da formação dessas mulheres como artesãs, observa-se a presença do design e de designers junto às artesãs, entre consensos e dissensos, mas, sempre com profissionais do design dirigindo o processo criativo. Partindo da perspectiva de que as relações sociais, em especial, as que envolvem o fenômeno da criatividade, estão permeadas pelas subjetividades dos indivíduos em constante tensão com as objetividades, reflito sobre como nesta equação, no caso em apreço, a autonomia criativa do grupo é submetida a imperativos da materialidade da vida, uma vez que o grupo em questão, constituído por mulheres tidas como de baixa renda, e fora do mercado de trabalho formal, é objeto de ações da aliança público-privada, com vistas à geração de trabalho e renda. As origens do grupo remontam ao contexto do final dos anos 1990, quando a crise no mundo trabalho reorientou políticas econômicas e de geração de renda e trabalho, com base na ideologia do empreendedorismo. No contexto, a criação de cooperativas de mulheres incluiu-se nas ações voltadas à (re)vitalização da atividade artesanal, pela ótica do empreendedorismo, consequentemente, adequando-a à estética do mercado e da competitividade. Nesta mirada, a criatividade das mulheres, transformadas, gradativamente, em artesãs, foi delimitada por intervenções variadas, sobretudo, de capacitações patrocinadas por instituições como Serviço de Apoio às Pequenas e Micro Empresas (Sebrae), Fundação Wall Ferraz (FWF), e Secretaria Municipal de Economia Solidária (Semest). Por meio destas, foram/são produzidas coleções de peças artesanais, com vistas a exposições, concursos e comercialização. Realizei levantamento das realizadas entre 1998 e 2017: coleções de bijuterias, de peças decorativas e utilitárias, sempre, em cocriação com profissionais do design. Como fundamentação teórica, focalizo categorias e conceitos como gênero, cooperativismo, design, artesanato, criatividade, e processo criativo, em diálogos interdisciplinares com autores(as) diversos(as). Na pesquisa documental, debrucei-me sobre o regimento da cooperativa de artesãs, certificados de capacitações, conteúdos de documentos físicos e virtuais (em sítios diversos), acervos fotográficos, dentre outros que possibilitaram reconstruir trajetórias dos sujeitos e do lócus empírico. Na pesquisa de campo, recorri à observação direta e participante, de cunho etnográfico, utilizando diário de campo, realizando entrevistas gravadas, e produzindo imagens fotográficas. Foram ouvidas treze artesãs cooperativadas, que passaram por capacitações para desenvolvimento de coleções, e quatro designers com atuações junto à Cooperart, além de três representantes de agências apoiadoras distintas. Os resultados da pesquisa forma construídos, em parte, pela interpretação de sentidos acionados por artesãs, e por designers, acerca de suas atuações no processo criativo de coleções, em cocriações, envoltas por conflitos, dissensos e consensos, objetividades e subjetividades, fantasias e concretudes. Também, de sentidos acionados por sujeitos apoiadores. Dentre as conclusões, constatei, dentre outras, que na relação entre artesãs e designers, estes(as) atuam como legitimadores(as) do gosto e das estéticas que orientam as criações, como intermediadores(as) de imperativos mercadológicos, e que a autonomia criativa do grupo de artesãs não é significada positivamente, como parte do processo, ainda que discursos de empoderamento sejam acionados. As capacitações ocorrem de modo frequente, não alcançando expectativas mais subjetivas do grupo, em termos da própria criatividade, além do que não há tempo hábil para que haja absorção efetiva dos aprendizados, ficando as artesãs mais como executoras, que como detentoras de algum saber, embora, nos interstícios deste sistema, haja subversões.