Este estudo de abordagem socioantropológica volta-se ao tema da constituição de territórios sociais de matrizes africanas nos centros urbanos em interface com processos de transformação da paisagem cultural do espaço citadino, tendo como foco lugares e trajetórias dessas religiosidades nas cidades. A pesquisa focalizou Povos de Terreiros da zona Norte de Teresina, Piauí, no âmbito de um processo de intervenções urbanísticas levadas a cabo pelo Programa Lagoas do Norte (PLN), política da Prefeitura Municipal de Teresina (PMT) com financiamento do Banco Mundial. Este programa de “requalificação urbana”, com ações de largo espectro, vem sendo implementado, desde 2008, em 13 bairros da região Norte de Teresina, que compõem uma área denominada região das Lagoas do Norte. O programa, no discurso da gestão pública municipal, é veiculado como um conjunto de intervenções ambientais, sociais e econômicas integradas em território determinado, a fim de (re)vitalizar, (re)urbanizar e (re)qualificar bairros da zona Norte da cidade, solucionando problemas socioambientais que acometem, há muito tempo, a região. Com ênfase na dimensão socioambiental, os documentos do PLN fazem referência a ações voltadas à “preservação e à proteção da cultura local”, a exemplo do projeto de construção de uma controversa “Praça dos Orixás”, a ser edificada como espaço de memória-celebração dos cultos religiosos afro-brasileiros na cidade. A zona Norte de Teresina, tem, historicamente, entre seus marcadores culturais e identitários, a religiosidade, expressa nas culturas religiosas de matrizes africanas, com vasto número de casas de Umbanda e Candomblé. O primeiro terreiro de que se tem notícia nesta região teria sido fundado na década de 1930, na área de convergência dos rios Parnaíba e Poti, reconhecida como ponto original do povoamento da cidade. Com o tempo, novas comunidades de terreiros foram-se formando, e instituindo territorialidades em Teresina. No processo de urbanização da cidade, terreiros localizados nas áreas centrais foram sendo deslocados, e muitos acabaram (re)territorializando-se na zona Norte, região tida como de “bairros populares”. Estes territórios sociais encontram-se novamente ameaçados, inclusive, de deslocamento involuntário de terreiros e de famílias de santo, previsto no processo de intervenção do PLN. Na perspectiva epistemológica da interpretação e produção de sentidos, em diálogo com autores e ideias, a pesquisa buscou apreender os sentidos e significados que vêm sendo produzidos e acionados pelos Povos de Terreiro, entre consensos e dissensos internos, e nas relações com o poder público, acerca da Praça dos Orixás e das ameaças de remoções involuntárias de terreiros, abrindo para novos questionamentos sobre políticas públicas de intervenção urbanística e os territórios de religiões de matrizes africanas no espaço urbano