As comunidades tradicionais são grupos socialmente e culturalmente diferenciados que
apresentam características muito peculiares em seu processo de desenvolvimento. Não obstante
terem sido, durante muitos anos, vitimadas por um processo desigual e não inclusivo, seus
membros trazem consigo heranças positivas como a riqueza dos saberes tradicionais que
propiciam diversas possibilidades de sobrevivência, sem provocar grandes alterações
socioambientais, convergindo com a ideia de sustentabilidade. Dentre esses grupos, inserem-se
os quilombolas, povos que têm na sua história marcas do processo de escravidão. A questão
central desta investigação direciona-se em saber: A forma com que as experiências
socioprodutivas estão organizadas nas comunidades quilombolas promovem dinâmicas
socioambientais? Como hipótese, acredita-se que o desenvolvimento em alicerces sustentáveis
é prerrogativa para alcançar crescimento socioeconômico aliado à conservação ambiental e
cultural e que as experiências socioprodutivas exercidas nas comunidades Custaneira e Tronco
não provocam degradação ao meio ambiente e promovem a sustentabilidade ambiental, social e
cultural. Ademais, mesmo sem agir de forma consciente, seguem os padrões estabelecidos pela
ciência, por meio dos conhecimentos tradicionais, da transmissão dos saberes e dos processos
simbólicos. Nesse sentido, objetivou-se levantar as experiências socioprodutivas nas
comunidades quilombolas Custaneira e Tronco no contexto do fortalecimento dos
conhecimentos tradicionais e do desenvolvimento sustentável local. Os procedimentos
metodológicos estão alicerçados nos métodos abordagem etnográfica e história de vida. As
técnicas de rapport, observação participante, não participante e turnê-guiada foram utilizadas
aliadas aos instrumentos de apoio diário de campo, gravador de voz e registro fotoetnográfico.
Foram aplicados 144 formulários padronizados entre os moradores. Os dados foram tabulados
em planilha de Excel e analisados por meio do software SPSS versão 24. Para as variáveis
qualitativas foram calculadas frequência absoluta e relativa. As variáveis quantitativas foram
resumidas por meio das estatísticas: média, desvio padrão, mínimo e máximo. Os teste quiquadrado e exato de Fisher foram utilizados para verificar possíveis relações de dependência
entre as variáveis. Para todos os procedimentos inferenciais foi adotado um nível de
significância de 5%. As comunidades registram baixos níveis de escolaridade, predominância
do gênero feminino e estado civil casado. Há primazia de adultos entre 25 a 59 anos com ganho
mensal abaixo de um salário mínimo, residente mais de 30 anos nas comunidades e morando
em casa própria, com estrutura de alvenaria, cobertura de telha e piso de cimento. São
majoritariamente trabalhadores rurais cuja produção é, quase sempre, para consumo próprio. O
milho (Zeamays L.), feijão (Phaseolusvulgaris L.), e mandioca (Manihotesculenta Crantz) são
as principais culturas produzidas. As experiências socioprodutivas locais envolvem o modo de
fazer dos alimentos, as formas de utilização dos recursos naturais, a relação sagrada com os
animais, a obediência ao ciclo lunar, as manifestações culturais, o calendário festivo e a relação
com o território. As comunidades Custaneira e Tronco são reconhecidas por uma dinâmica
cultural fortemente vinculada às lendas, mitos e crendices, por meio dos quais se revelam
simbolismos cosmológicos determinantes ao modo de vida local. Há um contexto favorável ao
etnoturismo representado nas paisagens cênicas, culinária, lugares sagrados, festividades,
danças, cosmologia, artesanato e na sólida organização política. A cultura exerce forte
influência na construção do arranjo local, assim como uma significativa capacidade de
resiliência e efetiva participação dos moradores nas decisões locais e a sustentabilidade está nas
ações locais por meio desse sistema de saberes que se projetam na maneira equilibrada de
manejar os recursos locais, na produção de subsistência, na reprodução de suas práticas
culturais, e, principalmente, na manutenção dos conhecimentos tradicionais.