A pesquisadora buscou compreender como o conhecimento tradicional das mulheres quebradeiras de coco babaçu do Piauí tem sido utilizado para informar ações políticas que levaram ao estabelecimento de uma lei estadual de acesso livre e proteção dos babaçuais e, ainda, da criação de uma nova categoria de acesso de povos e comunidades tradicionais a territórios, a Lei dos Territórios das Quebradeiras de Coco – legislações inovadoras que buscam a realização de direitos territoriais e proteção do meio ambiente. Para tanto, buscou-se recuperar as condições sociais que permitiram (e permitem) que o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) no Piauí desenvolvam essas ações e tenham obtido um extraordinário resultado em um contexto político mais geral de retrocesso político. Trata-se de uma pesquisa que combinou a recuperação histórica e cronológica da afirmação da identidade de quebradeira de coco no Piauí, assim como da criação do MIQCB no estado, por meio de instrumentos de história oral (entrevistas com as lideranças, pessoas ligadas ao movimento e representantes do poder público) e pesquisa documental (em fontes primárias basicamente dos arquivos do MIQCB); bem como a realização de uma etnografia exploratória, observação posicionada e diário de campo, com vistas a informar a elaboração/realização de uma descrição densa. A análise dos dados se deu de forma concomitante à coleta e análise dos discursos. Concluiu-se que a perspectiva do gênero pode aprofundar e fomentar as discussões na área das ciências ambientais, tendo em vista a mulher como vetor de sustentabilidade; que as simbologias do modo de ser e fazer das quebradeiras são ressignificados como elementos de luta marcados pela questão de gênero, caracterizando-as como uma comunidade que luta por reconhecimento e redistribuição. Ficou claro que as quebradeiras ao se afirmarem como “povos de floresta” , demonstram a importância do seu papel na proteção ambiental e, ao mesmo tempo, buscam autonomia nos seus territórios; ao explicarem que se “ninguém plantou a palmeira, ela não é de ninguém”, estão contrariando todo um sistema baseado na propriedade privada e a ideia do monocultivo próprio do agronegócio; ao declararem que são quebradeiras e não “catadeiras”, estão se impondo num contexto em que o conhecimento científico ainda é supervalorizado em detrimento do saber tradicional e mostrando que precisam ser ouvidas para serem ajudadas pela tecnologia. Por fim, compreendeu-se que o MIQCB se integra a um cenário nacional, não como tutelado, mas como propositor de temas a serem discutidos globalmente e que o cenário de lutas no Piauí se difere dos outros estados, sobretudo pela relação estabelecida com o Estado (como conquista do movimento), através de estratégias, articulações e parcerias nas quais é potente a firmação de uma identidade étnica marcada pelo gênero.