Na pesca, o conhecimento local (“TEK”) dos pescadores tem fornecido informações valiosas capazes de produzirem estratégias mais eficientes de conservação e gestão dos recursos. Mas como ele é influenciado e compartilhado dentro da comunidade? Como atributos intrínsecos do recurso influenciam na sua importância para a comunidade? Finalmente, como o TEK poderia refletir a relação pescador-peixe na comunidade? E quais suas implicações para a conservação e manejo dos recursos? Essas perguntas-chave foram aqui respondidas avaliando o TEK de pescadores artesanais de uma pescaria multiespecífica e de pequena-escala do médio rio Parnaíba, no nordeste do Brasil. A hipótese de que os pescadores teriam um conhecimento mais rico sobre peixes destinados ao consumo e comércio local foi confirmada, mas não em relação ao compartilhamento de conhecimento, que foi maior entre peixes de isca e de aquicultura. Foi também parcialmente confirmada a hipótese de que a riqueza e compartilhamento de conhecimento responderia ao perfil do pescador. O gênero masculino foi um preditor importante em todos os modelos ajustados. Entretanto, sugere-se cautela na sua interpretação, dadas peculiaridade e importância do TEK das mulheres na pesca. Os resultados também mostraram que o valor comercial do pescado influenciava na importância relativa da espécie, independentemente do tamanho ou peso. É possível que a sobrepesca tenha reduzido drasticamente a abundância de grandes bagres na região, influenciando a percepção atual dos pescadores. Analisando-se métricas de redes de interação pescador-peixe, observou-se um padrão de baixa modularidade e alto aninhamento. Em particular, a rede feminina era mais aninhada que a masculina, reforçando a ideia de que iniciativas para redução da vulnerabilidade socioecológica de sistemas de pesca poderiam incluir metas de redução da desigualdade de gênero. Outra dimensão do TEK aqui abordada avaliou a cosmovisão dos pescadores, analisando-se como seres sobrenaturais que habitam as águas interagem com eles e os peixes, e suas implicações no manejo de pesca. Finalmente, este estudo trouxe uma contribuição do TEK dos pescadores no preenchimento de lacunas de conhecimento sobre a distribuição geográfica de peixes, especificamente para o bagre estuarino Sciades herzbergii (Bloch, 1794).